sexta-feira, 29 de agosto de 2014

A "praga" do gerúndio no atendimento


Cada vez mais comum nos callcenters, vício de linguagem gera insegurança nos clientes

Os scripts de telemarketing chegaram às empresas brasileiras adaptados dos já existentes nos Estados Unidos. No inglês, o tempo verbal no gerúndio é utilizado com mais freqüência que no português. Na adaptação para o Brasil houve uma tradução literal, sem mudança do tempo verbal. E o gerúndio, na forma e freqüência que é utilizado no telemarketing, não é adequado para o português brasileiro. Aqui, esse tempo verbal é utilizado quando queremos falar sobre uma ação contínua futura que ocorre concomitante a outra. Por exemplo: "Minha família irá para o Rio de Janeiro na sexta à noite. Eu estarei indo para o litoral de SP"

Com o telemarketing o "gerundismo" instituiu-se como sendo um padrão mais educado de passar as informações para o cliente. Os operadores sentem que transmitem uma linguagem mais formal e mais culta. Errado! O uso do tempo verbal no gerúndio em excesso não transmite objetividade, nem tão pouco prontidão no atendimento. Passa, sim, a sensação sempre de uma ação futura distante, gerando a insegurança no cliente sobre quando será feito. Certa vez ouvi na empresa "Eu vou estar tentando estar pesquisando" O cliente pensará imediatamente: "Quando? Vai realmente fazer?".

E o pior é que o uso se faz tão instituído como adequado, que o vemos disseminado até fora do telemarketing. Entre jovens, principalmente, em seu esforço de buscar uma comunicação que pareça mais correta. Na escrita, já encontro excessos desse tempo verbal também.

O telemarketing tem como uma das preocupações principais a redução do TMA. Mas não investe na redução do gerundismo, estratégia importante para tornar a linguagem mais objetiva. Certa vez, monitorando uma operadora que "estourava" seu TMA, cronometrei uma explicação dada por ela a um cliente. Contamos, pelo menos, 10 ocorrências de gerúndio inadequado. No feedback reformulamos as frases e o tempo reduziu em 25 segundos. A rapidez no atendimento pode ser melhorada com redução do uso do gerúndio, não necessariamente falando mais rápido. Várias são as estratégias para eliminar esse gerúndio: transcrever os atendimentos e reescrevê-los com tempos verbais no presente, leituras de textos específicos, entre outros.

Além dessas e outras estratégias, é importante mostrar ao operador que o falar natural é muito mais importante do que tentar rebuscar a fala, deixá-la formal, principalmente usando erradamente algo que não faz parte da nossa Língua Portuguesa.


Livre-se do Gerúndio -

Comecemos pelo significado da palavra “gerúndio”. Se procurarmos as definições nas gramáticas em uso encontraremos, geralmente, a seguinte explicação: “Gerúndio é uma das formas nominais do verbo que apresenta o processo verbal em curso e que desempenha a função de adjetivo ou advérbio”.

Ele apresenta-se de duas formas. A simples (Ex.: Chegando a hora da largada, a luz verde acendeu.) e a composta (Ex.: Tendo chegado ao fim da corrida, o carro foi recolhido ao boxe.)

O gerúndio expressa uma ação que está em curso ou que ocorre simultaneamente ou, ainda, que remete a uma ideia de progressão. Sua forma nominal é derivada do radical do verbo acrescida da vogal temática e da desinência -ndo.  Exemplos: comendo; partindo.

Veja, a seguir, o uso do gerúndio na prática:

E a lama desceu pelo morro, destruindo tudo que encontrava pela frente.

Depois de vários dias chuvosos o sol despontou, alegrando o coração de todos.

Rindo, ele se lembrava com saudades dos dias felizes que tivera.

Abrindo o laptop, começou a escrever.

Com tanta malhação, José está mudando o seu corpo.

Os jornais andam falando que aquele político não presta.

“Caminhando sozinho aquela noite pela praia deserta, fiz algumas reflexões sobre a morte.” (Erico Verissimo, Solo de Clarineta, p. 12.)


Como vimos nos exemplos, o gerúndio pode ser empregado de diferentes maneiras em nossa língua sem que tenhamos praticado nenhuma heresia.

Já com o gerundismo é outra história. Nesse caso, trata-se do uso inadequado do gerúndio. Um vício de linguagem que se alastrou de modo tão corriqueiro e insistente que até já virou piada.

Então, se você usa expressões como: “Vou estar pesquisando seu caso.” “Vou estar completando sua ligação”.

Mude imediatamente sua fala para: “Vou pesquisar seu caso.” “Vou completar sua ligação.” Note que, nos dois casos, você passa a usar somente duas formas verbais (“vou” + “pesquisar” ou “vou” + “completar”) no lugar de três. Além disso, a ideia temporal a ser transmitida é a de futuro e não de presente em curso.

O gerundismo, portanto, é uma mania que peca pelo excesso, pela inadequação do verbo, que ocorre ao transformarmos, desnecessariamente, um verbo conjugado em um gerúndio. Vamos explicar melhor retornando ao exemplo já citado:

“Vou completar sua ligação.” (Construção correta = mais sintética e indica futuro.)

“Vou estar completando sua ligação.” (Construção errada, gerúndio desnecessário.)

Mas fique atento! Em algumas construções, quando a frase indica um processo com certa duração que ainda vai acontecer, não é errado dizer:

“Amanhã, enquanto você passeia, eu vou estar estudando o que é gerundismo. E, se deus quiser, aprenderei alguma coisa.”




FONTE: Call Center Info e Uol Educação.


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